6 de agosto de 2013

ALIMENTANDO NOSSA INFELICIDADE

|6 DE AGOSTO|

Lewis lamenta a morte da esposa, Joy

CONTINUA não havendo dúvida de que, em certo sentido, eu me "sinto melhor", e isso vem instantaneamente acompanhado de certa vergonha e de um sentimento de que há um tipo de obrigação de cultivar, fomentar e prolongar nossa própria infelicidade. [...] O que está por trás disso?
Em parte, sem dúvida, a vaidade. Gostaríamos de provar a nós mesmos que somos amantes de alta categoria, heróis trágicos; e não apenas soldados comuns no grandioso exército dos enlutados, que marcha por aí tentando ver o lado bom das coisas. Mas isso não é tudo.
Acredito que também haja certa confusão. Não desejamos realmente que o luto seja prolongado desde suas primeiras agonias: ninguém poderia desejar isso. Contudo desejamos outra coisa, da qual o luto pode vir a ser um sintoma frequente, e então confundimos o sintoma com a coisa em si. Escrevi certa vez  que o luto não é a interrupção do amor matrimonial, mas uma das suas fases normais - como a lua-de-mel. O que desejamos é viver o nosso casamento de forma boa e fiel, mesmo nessa fase. Se machuca (e com certeza machuca), aceitamos a dor como uma parte necessária dessa fase. Não queremos escapar dela a preço da deserção e do divórcio, matando o morto pela segunda vez. Éramos uma só carne. Agora que ela foi cortada em duas, não vamos fazer de conta que ela está inteira e completa. Ainda continuaremos casados, ainda apaixonados. Por isso, ainda sentiremos dor.

[C. S. Lewis]
- de A Grief Observed [A Anatomia de Uma Dor]

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