31 de julho de 2013

COMECE PEQUENO

|31 DE JULHO|

ESTÁ MAIS do que claro que, se não perdoarmos, não seremos perdoados. Não há alternativa quanto a isso. Então, o que fazer?
De qualquer jeito será bastante difícil, mas acho que existem duas coisas que podemos fazer para tornar essa situação mais fácil. Quem se inicia nos estudos da matemática não deve começar com cálculo, e sim com uma simples adição. Da mesma forma, se nós desejamos mesmos (e tudo depende de realmente desejar) aprender a perdoar, quem sabe devamos escolher algo mais fácil para começar do que a Gestapo. Quem sabe possamos começar perdoando o marido ou a esposa, ou os pais, ou os filhos, ou o colega mais próximo, pelo que fizeram ou disseram na semana passada. Isso provavelmente nos manterá ocupados por algum tempo. Depois disso, poderemos tentar entender o que significa exatamente amar o próximo como a si mesmo. Devo amá-lo como eu amo a mim mesmo.

[C. S. Lewis]
- de Mere Christianity [Cristianismo Puro e Simples]

30 de julho de 2013

O DEVER TERRÍVEL

|30 DE JULHO|

[UMA DAS virtudes menos populares] está inserida na regra cristã: "Ame o próximo como a si mesmo". Uma vez que na moral cristã "o próximo" inclui o "inimigo", nos deparamos com esse terrível dever de amar nosso inimigo.
Todo mundo diz que o perdão é uma ideia adorável, até que tenha alguma coisa para perdoar, como nós tivemos durante a guerra. E então, apenas a menção do assunto é motivo para suscitar reações de ódio. Não que as pessoas achem essa virtude sublime e difícil demais de ser obtida; elas a consideram odiosa e desprezível. "Esse tipo de assunto as deixa doentes", dizem. E aposto que você está louco para me perguntar: "Gostaria de saber como se sentiria com a ideia de perdoar a Gestapo se fosse um judeu ou polonês".
Eu também queria saber. Eu me questiono muito sobre isso. Quando o cristianismo me diz que não devo negar a minha religião, nem mesmo para escapar da morte sob tortura, também fico me perguntando o que faria se a coisa chegasse a esse ponto. Não estou tentando lhe dizer o que eu poderia fazer  quanto a isso - há bem pouca coisa que eu posso fazer. O que estou tentando é falar-lhe a respeito do cristianismo. Não fui eu quem o inventou. E ali, bem no meio dele, me deparo com isso: "E perdoe os nosso pecados, assim como nós perdoamos aqueles que pecaram contra nós". Isso não dá margem para o pensamento de que o perdão possa ser-nos oferecido sob qualquer outra condição.

[C. S. Lewis]
- de Mere Christianity [Cristianismo Puro e Simples]

29 de julho de 2013

ESSA COISA CHAMADA EU

|29 DE JULHO|

ADMITO que isso significa amar pessoas que nada tem de amável. Porém, será que há algo de amável em nós mesmos? Você se ama simplesmente porque é você mesmo. Deus quer que amemos todas as pessoas da mesma forma e pela mesma razão. Ele solucionou o problema em nós mesmos para nos mostrar como a vida funciona. O que temos de fazer então é ir em frente e aplicar a regra a todos os outros. Talvez facilite se lembrarmos que é assim que Deus nos ama. Não por quaisquer qualidades atrativas que imaginamos ter, mas só porque somos algo chamado "eu". Na realidade, não há mais nada de amável em nós; somos criaturas que tem tanto prazer no ódio, que abrir mão dele seria para nós tão difícil quanto abrir mão da bebida ou do cigarro.

[C. S. Lewis]
- de Mere Christianity [Cristianismo Puro e Simples]

28 de julho de 2013

AME O SEU INIMIGO

|28 DE JULHO|

IMAGINO que alguém dirá: "Bem, se nos é permitido condenar os atos dos nossos inimigos, punindo-os e matando-os, que diferença poderá haver entre a moralidade cristã e a perspectiva comum?". Acredito que toda a diferença do mundo! Lembre-se: nós cristão acreditamos que o homem viverá para sempre. Portanto, o que realmente importa são aqueles pequenos marcos ou deformações do lado de dentro da alma que o transformarão, ao longo do processo, em uma criatura celestial ou infernal. Devemos matar, se necessário, mas jamais devemos odiar os inimigos ou ter prazer em odiá-los. Devemos punir, se necessário, mas não devemos sentir prazer em fazê-lo. Em outras palavras, o que é preciso matar é algo que está dentro de nós; o ressentimento, o desejo de se satisfazer com a vingança. Não quero dizer que alguém seja capaz de decidir, de uma hora para a outra, que nunca mais sentirá isso. Não é assim que as coisas acontecem. O que eu quero dizer é que, toda vez que isso nos passar pela cabeça, dia após dia, ano após ano, por toda a nossa vida, precisamos eliminar esse pensamento. Trata-se de um trabalho pesado, mas a tentativa não é impossível. Mesmo quando matamos e punimos, temos que nos emprenhar em ter o mesmo sentimento pelo inimigo que temos por nós mesmos - Temos de torcer para que ele deixe de ser mau; esperar que ele seja curado, quer seja neste mundo, quer no outro; é isso o que a Bíblia quer dizer por amar os inimigos: temos de sinceramente desejar o melhor para ele, sem fazer de conta que somos seus fãs e sem dizer que ele é legal quando ele não é.

[C. S. Lewis]
- de Mere Christianity [Cristianismo Puro e Simples]

27 de julho de 2013

O VERDADEIRO TESTE

|27 DE JULHO|

SUPONHAMOS que você tenha acabado de ler no jornal uma notícia sobre algum atrocidade repugnante. Suponhamos que, em seguida, alguém apareça, sugerindo que a história pode não ser verdadeira ou que não é assim tão trágica quanto foi mostrada. Qual seria o seu primeiro sentimento? Será que pensaria: "Graças a Deus, nem mesmo eles conseguem ser tão maldosos assim"; ou será que ficaria desapontado, ou até mesmo determinado a acreditar mais na primeira história pelo puro prazer de imaginar o pior possível dos seus inimigos? Temo então que esse último caso seja o primeiro passo de um processo que, se levado às últimas consequências, acabará fazendo de nós verdadeiros diabos. Veja bem, o que estamos começando a desejar é que o preto se torne ainda mais preto. Se continuarmos a alimentar esse desejo, acabaremos, mais para frente, por confundir o cinza com o preto e, em seguida, até o branco com o preto. Finalmente, acabaremos por considerar todas as coisas como sendo malignas - incluindo Deus, nossos amigos, e até nós mesmos - e acabaremos nos tornando incapazes de parar de agir assim, fixando-nos para sempre em um mundo dominado por puro ódio.

[C. S. Lewis]
- de Mere Christianity [Cristianismo Puro e Simples]

26 de julho de 2013

MÚSICA DO DIA [26.07.2013]


Salzband - Você Veio

CONECTE-SE


Vídeo feito pelo nosso Pedro Rolemberg! Ficou demais cara. Espero que venham outros como este.

AME O PECADOR...

|26 DE JULHO|

PENSANDO bem, agora me lembro de ter tido professores cristãos que há muito tempo me ensinaram que devo odiar as coisas más que as pessoas praticam, sem odiar as pessoas más; ou, como eles teriam o dito, odiar o pecado, ao invés de odiar o pecador.
Essa distinção me parecia bastante tola e sem muito sentido: como seria possível odiar o que uma pessoa fez, sem odiá-la? Porém, anos depois, ocorreu-me que havia um homem com o qual eu estive fazendo isso toda a vida - eu mesmo. Não importa o quanto eu me descontente com minha própria covardia, presunção ou ambição, não deixarei de me amar por isso. Nunca tive a menor dificuldade quanto a isso. Na verdade, a razão por que eu odiava o que fazia era que eu me amava. Era exatamente o ato de amar a mim mesmo que me fazia lamentar a descoberta de que eu era o tipo de pessoa que fazia aquelas coisas. Consequentemente, o cristianismo não espera que reduzamos em um só milímetro o ódio que sentimos pela crueldade e pela traição. Temos mais é que odiar essas coisas. Nenhuma palavra do que dissermos sobre elas precisa ser desdita. Por outro lado, temos que odiar essas coisas nos outros da mesma forma que as odiamos em nós mesmos: lamento muito que a pessoa tenha agido assim, e esperando que, se possível, de alguma forma, algum dia e em algum lugar, ela possa ser curada, voltando a se tornar humana.

[C. S. Lewis]
- de Mere Christianity [Cristianismo Puro e Simples]

25 de julho de 2013

AME O PRÓXIMO COMO A SI MESMO

|25 DE JULHO|

POIS BEM, quanto exatamente eu amo a mim mesmo?
Agora que estou pensando sobre isso, não posso dizer com precisão que sinto alguma ternura ou afeto por mim mesmo. Nem mesmo aprecio sempre a minha própria companhia. Então, tudo indica que "amar o próximo" não quer dizer me "sentir interessado por ele" ou "achá-lo atraente". Eu já devia ter percebido isso antes, pois é claro que eu não posso me interessar por uma pessoa só tentando. Será que me considero bom ou me acho um cara legal? Bem, temo que às vezes eu realmente me veja assim (e esses, sem dúvida, são os meus piores momentos). Porém, esse não é o motivo porque eu me amo. Na verdade, o que acontece é exatamente o contrário: meu amor-próprio é o que faz com que eu me ache legal, mas achar-me legal não é a razão para eu me amar. Semelhantemente, amar os meus inimigos também não significa que tenho de achá-los legais. Isso é um grande alívio, pois grande parte das pessoas imagina que perdoar os inimigos significa fazer de conta que eles não são assim tão ruins, mesmo quando a evidência mostra que eles o são. Dê um passo além. Nos meus momentos de maior lucidez eu não só não me acho uma pessoa legal, como também tenho plena consciência de que na verdade sou um ser bastante asqueroso. Sou capaz de olhar para algumas coisas que eu já cometi com horror e asco. Então, também me é permitido ter asco e ódio de alguns atos cometidos pelos meus inimigos.

[C. S. Lewis]
- de Mere Christianity [Cristianismo Puro e Simples]

24 de julho de 2013

ALERTA OU INCENTIVO?

|24 DE JULHO|

HÁ UM ALERTA ou um incentivo para cada um de nós. Se você é uma pessoa legal - que tem facilidade de alcançar virtudes -, tenha cuidado! Muito se espera daqueles a quem muito é dado. Se você considerar mérito seu o que na verdade são presentes que Deus lhe deu por meio da natureza e se contentar em ser uma pessoa simplesmente legal, não passará de um rebelde. E os dons só o levarão a cair de forma ainda mais terrível; o tornarão ainda mais corrupto e seu mau exemplo, ainda mais desastroso. O próprio demônio já foi um arcanjo; os dons naturais dele estavam tão acima dos seus quanto os seus estão acima dos dons dos chimpanzés.
Porém, se você não é uma pobre criatura, envenenada pela má criação em uma casa cheia de invejas e intrigas absurdas - exposta, sem que tivesse escolha, a alguma perversão sexual; e diariamente atormentada por um complexo de inferioridade que a faz desmoronar diante dos seus melhores amigos -, não se desespere. Ele sabe de tudo isso. Você é um dos pobres que ele abençoou. Ele sabe a situação precária do carro que você está tentando dirigir. Não desiste. Faça o que puder. Algum dia (quem sabe em outro mundo, mas talvez, até antes disso) ele o jogará no ferro-velho e lhe dará um novinho. Então, você poderá impressionar a todos - e principalmente a si mesmo -, pois terá aprendido a guiar na autoescola mais exigente do mundo. (Alguns dos últimos serão os primeiros e alguns dos primeiros, os últimos)

[C. S. Lewis]
- de Mere Christianity [Cristianismo Puro e Simples]

23 de julho de 2013

FORA DE COMBATE

|23 DE JULHO|

O conselho de Screwtape para arrancar o paciente das mãos do Inimigo [Deus]

AINDA falta refletirmos sobre como nos recuperar desse desastre. O segredo está em impedi-lo de tomar quaisquer providências. Não importa o quanto ele pense nesse novo arrependimento, desde que ele não o converta em ação. Deixe o pequeno animal chafurdar-se nele. Você pode até deixá-lo escrever um livro sobre isso; geralmente é uma excelente maneira de esterilizar as sementes que o Inimigo [Deus] plantou na alma humana. Dê-lhe toda liberdade de fazer o que quiser, exceto de agir. Nenhuma quantia de piedade que esteja em sua imaginação e afeições podem nos ameaçar, desde que a mantenhamos longe de sua vontade. Como um desses seres humanos costumava dizer, os hábitos ativos podem ser reforçados pela repetição, mas os passivos são por ela enfraquecidos. Quanto mais frequente ele sentir sem agir, menos estará em condições de agir, e, ao longo do processo, menos ele estará em condições de sentir.

[C. S. Lewis]
- dde The Screwtape Letters [Cartas do Diabo a Seu Aprendiz]

22 de julho de 2013

A ESPERANÇA DA RESSUREIÇÃO

Por Charles Swindoll


O que dá coragem à viúva ao acabar de sepultar o marido? Qual a última esperança para os deficientes e as vítimas de abuso ou queimaduras? Qual a resposta final para dor, luto, senilidade, insanidade, moléstias incuráveis, calamidades súbitas e acidentes fatais? A resposta a cada uma dessas perguntas é a mesma: a esperança da ressurreição do corpo.
Apenas imagine... aqueles que hoje são fisicamente incapazes um dia irão saltar alegres e extasiados. Os que passam a vida em total escuridão, verão todas as cores do arco-íris. Na verdade, o primeiro rosto a ser contemplado será o daquele que lhes dá visão!
Não há nada como a esperança da ressurreição para reanimar os espírito atormentados daqueles que tem um peso no coração.
Talvez alguém pergunte: "Mas como podemos ter certeza?" ou "O que nos dá tamanha segurança, confiança tão inabalável?". Essas perguntas tem a mesma resposta: a ressurreição de Cristo.
Porque Ele foi ressuscitado, nós também o seremos!


[Dia a Dia com Charles Swindoll, pág. 44]

JULGANDO PELOS RESULTADOS

|22 DE JULHO|

SE O CRISTIANISMO é verdadeiro, então por que nem todos os cristãos são necessariamente mais agradáveis do que os não-cristãos? O que está por trás desta questão é em parte razoável e em parte inadmissível. A parte razoável é esta: se a conversão ao cristianismo não representa nenhum aperfeiçoamento nas ações do ser humano - se ele continuar sendo tão metido, rancoroso e vingativo; tão corroído pela inveja ou ambicioso quanto era antes - então poderemos suspeitar que a sua "conversão" foi totalmente imaginária. Depois da nossa conversão inicial, toda vez que achamos que fizemos algum avanço, esse é o teste que devemos fazer. Sentimentos nobres, novos insights, um interesse maior pela "religião" podem não significar nada, a menos que isso realmente melhore o nosso comportamento. O mesmo acontece quando ficamos doentes. "Sentir-se melhor" pode não significar nada, se o termômetro indicar que a nossa temperatura continua subindo. Nesse sentido, o mundo secular até está certo em julgar o cristianismo por seus resultados. Uma árvore é conhecida por seus frutos; a melhor prova da qualidade de um pudim é o seu gosto. Quando nós, cristãos, nos comportamos mal, ou deixamos de nos comportar como deveríamos, tornamos o cristianismo desacreditado para o mundo lá fora. Os cartazes dos tempos de guerra diziam que conversa fiada pode custar vidas. A recíproca é verdadeira: "vidas fiadas" dão o que falar. Se levarmos nossas vidas sem responsabilidade, as pessoas de fora começarão a falar; e nós teremos lhes dado bons motivos para duvidar do próprio cristianismo.

[C. S. Lewis]
- de Mere Christianity [Cristianismo Puro e Simples]

21 de julho de 2013

REFLEXO DA VIDA DIVINA

|21 DE JULHO|

ESSAS exigências divinas, para nossos ouvidos naturais mais parecem vindas de um tirano do que de um ser amoroso, nos guiam para onde deveríamos querer ir se soubéssemos o que queremos. Ele reivindica o nosso louvor, nossa obediência, nossa reverência. Seria razoável supor que essas coisas poderiam fazer algum bem a ele ou provocar-lhe medo? Ou, como se diz no canto de Milton, será que a irreverência humana seria capaz de levar "à diminuição da sua glória"? Ninguém é capaz de diminuir a glória de Deus recusando-se a louvá-lo, da mesma forma que um lunático não é capaz de impedir o sol de nascer pichando a palavra "escuridão" nas paredes da sua cela. Mas Deus deseja o nosso bem, e o nosso bem é amá-lo (com esse amor de gratidão, próprio das criaturas). E para amá-lo, temos de conhecê-lo; e se o conhecermos, iremos de fato reverenciá-lo. Do contrário, daremos provas de que o que estamos tentando amar ainda não é a Deus - por mais que essa seja a aproximação máxima de Deus que o nosso pensamento e a nossa fantasia conseguissem alcançar. No entanto, nosso chamado não é só para a reverência e o temor; mas também para refletirmos a vida divina, participando como criatura dos atributos divinos que estão muito além dos nossos desejos presentes. Somos convidados a nos "vestir de Cristo", a nos tornarmos como Deus. Isto significa que, quer gostamos ou não, Deus pretende nos dar o que necessitamos e não o que supomos desejar agora. Mais uma vez, ficamos constrangidos pela extravagante benevolência, por demasiado amor, e não pela falta dele.

[C. S. Lewis]
- de The Problem Of Pain [O Problema do Sofrimento]

20 de julho de 2013

DEFININDO NOSSAS EXPRESSÕES

|20 DE JULHO|

O NOME cristão foi atribuído pela primeira vez em Antioquia (Atos 11.26) aos "discípulos", àqueles que aceitavam o ensinamento dos apóstolos. E não era restrito aos que teriam aproveitado ao máximo tais ensinamentos. Ele não era limitado àqueles que, de forma mais perfeita, espiritual e interiorizada, estavam "mais próximos do espírito de Cristo" do que os discípulos mais relapsos. Essa questão não é teológica ou moral. É apenas uma questão de usar as palavras de tal maneira que todos sejam capazes de entender o que está sendo dito. Quando uma pessoa aceita a doutrina cristã e vive de modo contrário aos seus ensinamentos, é mais certo dizer que ela é uma péssima cristão do que dizer que ela não é cristã.

[C. S. Lewis]
- de Mere Christianity [Cristianismo Puro e Simples]

19 de julho de 2013

POR QUE FICAR CALMO?

Porque Deus é onipotente, onisciente e onipresente, o cristão não precisa ficar agitado e nem ansioso.

Porque Deus ama, enxerga a lágrima e ouve as orações, o cristão não precisa ficar desesperado.

Porque Deus perdoa, redime e salva, o cristão não precisa relembrar o passado.

Porque Deus veste a erva do campo, que hoje dá flor e amanhã desaparece, o cristão não precisa se preocupar com coisa alguma.

Porque Deus não deixou de entregar seu próprio Filho, mas o ofereceu por ele, o cristão não precisa vacilar.

Porque Deus está ao seu lado, o cristão não deve se apavorar por qualquer coisa.

Porque Deus o abençoou com "todo tipo de bençãos espirituais do céu" (Ef 1.3), o cristão não deve ter complexo de inferioridade algum.

Porque todas as coisas juntamente contribuem para o seu bem, o cristão não precisa se sentir miserável, infeliz, pobre, cego e nu.

Porque tem o penhor do Espírito, o cristão não precisa ter dúvida de sua salvação ou medo de perdê-la.

Porque Jesus ressuscitou dentre os mortos, o cristão não deve pensar que a sua fé é inútil.

Porque olho nenhum viu, ouvido nenhum ouviu, mente nenhuma imaginou o que Deus preparou para ele, o cristão não tem o direito de duvidar da glória vindoura.


[Revista Ultimato, maio.junho 2013, ano XLVI, nº 342]

O VERDADEIRO EU

|19 DE JULHO|

DEVE haver uma entrega real do eu. Você precisa jogá-lo fora, por assim dizer, "cegamente". Cristo lhe oferecerá uma personalidade de verdade, mas você não deve procurá-lo só por isso. Se a sua personalidade verdadeira é o que importa, então é bem pouco provável que você procure a Cristo. O primeiro passo nessa direção é tentar esquecer o seu eu de uma vez por todas. O seu verdadeiro e novo eu (que é de Cristo e também seu, sendo seu justamente por ser de Cristo) não surgirá enquanto você estiver procurando por ele. Surgirá quando você procurar por Cristo. Isso lhe soa estranho? O mesmo princípio se aplica às coisas do cotidiano. Até na vida social você jamais passará uma boa impressão às pessoas, enquanto não parar de pensar sobre o tipo de impressão que está passando. O mesmo se aplica à literatura e à arte; ninguém que se preocupa em ser original será capaz de ser realmente original; se você simplesmente se empenhar em dizer a verdade (sem dar a mínima para a quantidade de vezes que ela já tenha sido dita), em noventa por cento dos casos você se tornará original, sem ter se dado conta disso. Esse princípio perpassa a vida toda, de alto a baixo. Abra mão de si mesmo e descobrirá o seu verdadeiro eu. Perca a sua vida e você a salvará. Submeta-se à morte, à mortificação das suas ambições e dos seus desejos favoritos todos os dias e à morte do seu corpo no final; submeta-se com todo o seu ser, e achará a vida eterna. Não retenha nada. Nada que você não entregar será realmente seu. Nada que não tenha morrido em você poderá ressuscitar dos mortos. Se você continuar buscando-se a si mesmo, ao longo do caminho, só achará ódio, solidão, desespero, fúria, ruína e decadência. Porém, se você buscar a Cristo, certamente o encontrará e com ele todas as demais coisas acrescentadas.

[C. S. Lewis]
- de Mere Christianity [Cristianismo Puro e Simples]

18 de julho de 2013

FORA DO SISTEMA

TRANSFORMADOS

|18 DE JULHO|

PARECE que está na hora de pegar emprestado outra parábola de George MacDonald. Imagine-se como uma casa. Deus entra em cena para fazer uma reforma nesta casa. No começo, talvez você até entenda o que ele está fazendo. Ele está consertando os ralos entupidos, as goteiras no teto e assim por diante; você já sabia que esse serviços tinham de ser feitos e, por isso, não fica nada surpreso. Mas, no momento em que ele começa a martelar por toda a casa, de forma incrivelmente dolorosa, as coisas já não parecem mais fazer sentido. O que Deus está pretendendo afinal? A explicação é que ele está construindo um prédio bem diferente do que você tinha imaginado - jogando fora uma ala inteira aqui, colocando um novo andar ali, levantando torres, instalando jardins. Você imaginava que seria transformado num casebre; mas, na verdade, ele está construindo um palácio. E ele pretende vir morar neste palácio.
O mandamento sede perfeitos não é um idealismo barato. Tampouco se trata de um mandamento para fazermos o impossível. Ele nos transformará em criaturas capazes de ouvir e obedecer aos seus mandamentos. Deus diz (na Bíblia) que somos "divinos" e ele fará suas palavras se cumprirem. Se nós o deixarmos fazer isso - pois poderemos impedi-lo se preferirmos -, ele transformará as débeis e asquerosas pessoas que somos em criaturas divinas, deslumbrantes, radiantes, imortais, com tanta energia, alegria, sabedoria e amor pulsando por todo o corpo, que não podemos sequer imaginar. [Seremos transformados]  em espelhos claros e imaculados que refletem perfeitamente (embora, é claro, numa escala menor), o próprio poder ilimitado, o prazer e a bondade de Deus. O processo será longo e, em parte, bastante dolorido, mas é para isso que fomos criados. Para nada menos. O que Cristo disse é para valer!

[C. S. Lewis]
- de Mere Christianity [Cristianismo Puro e Simples]

17 de julho de 2013

DUAS FACES DA VERDADE

|17 DE JULHO|

TEMOS aqui outra maneira de apresentar a duas faces da verdade. Por um lado, não devemos jamais imaginar que seja possível confiar em nossos próprios esforços para nos comportarmos, mesmo que só pelas próximas vinte e quatro horas, de forma correta. Se não estivermos apoiados em Cristo, nenhum de nós poderá evitar cometer algum grande pecado. Por outro lado, nenhum ato de santidade ou heroísmo dos maiores santos está além daquilo que está decidido a produzir em cada um de nós no final. Esse trabalho jamais estará completo nesta vida; porém, Cristo quer nos levar o mais longe possível antes da morte.
Por isso é que não temos razão alguma para nos surpreender, quando passamos por tempos difíceis. Quando uma pessoa se volta para Cristo e parece estar se dando bem (no sentido de que certos hábitos ruins estão sendo corrigidos agora), geralmente supomos que, a partir de então, o natural seria que as coisas acontecessem de forma mais fácil. Quando surgem os problemas - doenças, dificuldades financeiras, novos tipos de tentações - ficamos desapontados. Pensamos que tais coisas podem até ter sido necessárias no passado para nos levar ao arrependimento; mas por que agora? Porque Deus quer forçar-nos a ir em frente, para cima, rumo ao nível mais alto, colocando-nos em situações em que temos de ser mais corajosos, ou mais pacientes, ou mais amorosos do que nunca sonhamos ser. Tudo isso parece bastante desnecessário para a maioria de nós, pois ainda não temos a mínima ideia do algo tremendo em que ele pretende nos tornar.

[C. S. Lewis]
- de Mere Christianity [Cristianismo Puro e Simples]

16 de julho de 2013

UMA ESPADA NAS MÃOS DE DEUS

|16 DE JULHO|

Lewis lamenta a morte de sua esposa, Joy

O LOUVOR é uma forma de amor que sempre traz em si um elemento de alegria. Louvor na ordem certa; a ele, como doador, e a ela, como presente. No louvor nos alegramos, de alguma forma, com a coisa que estamos louvando, não importa o quão longe estejamos dela, certo? Eu iria até mais longe. A alegria que eu tinha em H. me foi tirada. E estou bem longe, imerso em minha dessemelhança, daquele gozo que um dia eu espero ter em Deus se suas misericórdias forem infinitas para comigo. Mas louvando, ainda posso, até certo ponto, alegrar-me nela e também, até certo ponto, alegrar-me nele. Isso é melhor do que nada.
Porém, talvez me falte o dom. Reconheço que comparei H. a uma espada. Isso é verdade, até certo ponto. Contudo é, em última instância, pouco apropriado em si mesmo, e pode redundar no engano. Eu deveria ter sido mais equilibrado. Na verdade, eu deveria ter acrescentado: "Mas ela é também como um jardim. Como um conjunto de jardins, com paredes, cercas e, mais secreto, mais cheio de fragrância e vida fértil conforme você entra nele".
Então só o que me resta é louvá-la e a todas as coisas criadas, que são, "de alguma forma, e uma forma única, como àquele que as fez".
E assim por diante, do jardim ao Jardineiro, da espada ao Ferreiro, devo louvar a vida doadora de vida e a beleza torna tudo belo.
"Ela está nas mãos de Deus". Essa ideia renova minhas energias quando penso nela como uma espada. Talvez a vida que eu compartilhei com ela neste mundo foi apenas parte do processo de temperá-la. Agora, quem sabe, ele desembainhe a espada; pese sua arma nova; faça desenhos no ar com ela - "a verdadeira espada de Jerusalém".

[C. S. Lewis]
- de A Grief Observed [A Anatomia de Uma Dor]

15 de julho de 2013

COM TERNURA

|15 DE JULHO|

Lewis lamenta a morte de sua esposa, Joy

QUEM liga para esse meu sofrimento, para como ele está se processando ou para o que eu faço com ele? Que diferença fazem as minhas lembranças dela, se é que me lembro dela? Nenhuma dessas coisas poderia aliviar ou agravar o sofrimento pelo qual ela passou.
A aflição do passado. Como eu posso saber que toda a sua aflição já passou? Eu nunca acreditei - ou pelo menos achava muito improvável - que a mais crédula das almas fosse capaz de passar direto para a perfeição e para a paz no momento em que a morte apertasse a sua garganta. Passar a acreditar nisso agora seria brincar com o desejo de vingança. H. era fantástica; uma alma simples e direta, brilhante e precisa como uma espada. É claro que ela não era nenhuma santa. Ela era uma mulher pecadora, cada com um homem pecador; dois pacientes de Deus, ainda não curados. Sei muito bem que há apenas lágrimas para secar, mas também máculas para ser expurgadas. E com isso, a espada ficará até mais afiada.
Mas, ó Deus, faça-o com ternura.

[C. S. Lewis]
- de A Grief Observed [A Anatomia de Uma Dor]

14 de julho de 2013

CHARUTOS NO CÉU

|14 DE JULHO|

Lewis lamenta a morte de sua esposa, Joy

TENHO PLENA consciência de que os meus desejos mais internos são precisamente os que eu jamais terei capacidade de conquistar. A velha vida, as piadas, os drinques, as discussões, o fazer amor, o pequeno e o comovente lugar-comum. Não importa a partir de que ângulo eu encare. Dizer "H. está morta" é dizer "Tudo isso já era". Isso já faz parte do passado. E o passado é o que o tempo significa. E o próprio tempo é outro nome que damos à morte. E o céu é um lugar onde "as coisas velhas já passaram".
Sou aberto para conversar sobre a verdade da religião e ouvirei com a maior satisfação. Você pode até me falar dos deveres da religião; sou todo ouvidos. Porém, se me vier com a conversa de que a religião é algum tipo de consolo, suspeitarei que você não sabe do que está falando.
A menos, é claro, que você acredite literalmente em tudo que se diz sobre os encontros familiares "no outro mundo", descritos numa perspectiva totalmente terrena. Esse tipo de coisa é antibíblica e tirada de músicas e litogravuras de péssima qualidade. Não há uma só palavra sobre isso na Bíblia. Sabemos muito bem que não pode ser verdade. A realidade nunca se repete. Nunca somos privados de alguma coisa para depois recuperá-la como era antes. Como os espiritualistas mordem a isca! [Eles alegam que] "as coisas desse lado não são em nada diferentes". Teremos até charutos no céu, pois são por coisas desse tipo que todos nós ansiamos. O querido passado restaurado.
É por isso, e só por isso, que clamo, com loucas súplicas e exigências cegas feitas para o vazio.

[C. S. Lewis]
- de A Grief Observed [A Anatomia de Uma Dor]

13 de julho de 2013

SIMPLESMENTE UMA FASE

|13 DE JULHO|

Lewis lamenta a morte de sua esposa, Joy

ENTÃO, de repente, uma pessoa conhecida morre. E vemos isso como um amor bruscamente interrompido, com uma dança suspensa bem no meio da evolução, ou como uma flor cujo botão foi decepado de forma cruel - algo truncado e que, por isso mesmo, ficou todo deformado. Fico espantado. Não consigo deixar de suspeitar que os mortos também sentem as dores da separação (e quem sabe esse não seja um dos sofrimentos purgativos). Nesse caso, o luto se torna, para ambos os amantes e para todos os casais, sem exceção, uma parte universal e integral da experiência de amor. Ele é a sequência normal do casamento, assim como o casamento é a sequência do namoro e o outro é a sequência do verão. Não se trata de um processo truncado, mas de uma de suas fases; não se trata de uma interrupção da dança, mas da próxima sequência musical. Enquanto a pessoa amada está viva, ela nos "arranca para fora de nós mesmos". O que entra em cena depois disso é o espetáculo trágico de uma coreografia em que precisamos aprender a continuar sendo "arrancados de dentro de nós mesmos", apesar da ausência da presença corpórea; precisamos continuar a amar sem cair no erro de passar a amar o nosso passado, ou então, a nossa memória, ou o nosso sofrimento, ou o alívio do sofrimento, ou, quem sabe, o nosso próprio amor.

[C. S. Lewis]
- de A Grief Observed [A Anatomia de Uma Dor]

12 de julho de 2013

FALSA HUMILDADE

|12 DE JULHO|

PENSO que muitos de nós, quando Cristo nos capacita a superar um ou dois pecados que realmente incomodam, tendemos a achar (ainda que não o expressemos em palavras) que já nos tornamos bons o suficiente. Deus já fez tudo que queríamos que fizesse, então nós agradeceríamos se ele nos deixasse sozinhos. Como costumamos dizer: "Eu não esperava ser santo, eu só queria ser uma pessoa normal". E, quando dizemos isso, achamos que estamos sendo humildes.
Porém, esse é um erro fatal. É claro que nós jamais desejamos e pedimos para ser transformados no tipo de criaturas em que ele irá no transformar. Contudo, a questão não é o que pretendíamos ser, e sim o que ele pretendia que nós fossemos quando nos criou. Ele é o inventor, nós somos as máquinas. Ele é o pintor, nós somos suas telas. Como poderíamos saber o que ele quer que sejamos? Veja bem, Deus já nos tornou em algo bem diferente do que éramos. Há muito tempo. antes de termos nascido, quando estávamos dentro da barriga de nossa mãe, passamos por vários estágios. Já fomos parecidos com vegetais e com peixes: foi só em um estágio posterior que nos tornamos bebês humanos. E, se estivéssemos conscientes disso naqueles estágios anteriores, ouso dizer, teríamos nos contentado em permanecer como vegetais ou peixes - não teríamos muita vontade de nos tornar bebês. Mas ele conhecia o plano que tinha para nós o tempo todo e estava determinado a colocá-lo em prática. Algo parecido com isso está acontecendo agora, num nível mais alto. Muitas vezes nos contentamos em permanecer como "pessoas comuns"; mas Deus está determinado a por em prática um plano bem diferente. Fugir desse plano não tem nada de humildade; trata-se na verdade de preguiça e covardia. Submeter-se a tal plano não significa prepotência ou megalomania, e sim obediência.

[C. S. Lewis]
- de Mere Christianity [Cristianismo Puro e Simples]

11 de julho de 2013

TUDO OU NADA

|11 DE JULHO|

POR UM lado, a reivindicação divina por perfeição não deve, de forma alguma, desencorajá-lo em suas atuais tentativas de ser bom, nem mesmo nos erros cometidos no dia de hoje. Cada vez que você cair, ele o levantará de novo. Ele sabe perfeitamente que por seus esforços você jamais se aproximará da perfeição. Por outro lado, você precisa receber desde já que o fim para o qual Cristo começa a guiá-lo é a perfeição plena; e nenhum poder em todo o universo, a não ser você mesmo, pode impedi-lo de fazer você chegar a esse objetivo. É para isso que você está aqui. E é muito importante que você perceba isso. Se não percebermos, então é muito provável que comecemos a rejeitá-lo e a resistir a ele depois de certo ponto.

[C. S. Lewis]
- de Mere Christiniaty [Cristianismo Puro e Simples]

10 de julho de 2013

"EU O TORNAREI PERFEITO"

|10 DE JULHO|

ELE bem que advertiu as pessoas a "calcularem o custo" antes de se tornarem cristãs. "Não cometa nenhum erro", ele diz; "se você deixar, eu o farei perfeito. Na hora em que você se coloca em minhas mãos, isso é o que acontecerá. Nada menos ou diferente disso. Você tem  livre-arbítrio, e se quiser pode até me rejeitar. Porém, se você não me empurrar, pode ter certeza que eu vou levar adiante esse trabalho. Não importa o sofrimento que cause em sua vida terrena, não importa que purificação inconcebível possa lhe custar depois da morte, não importa o quanto custe para mim, eu nunca descansarei, nem o deixarei descansar, até que você esteja literalmente perfeito - até que o meu Pai possa dizer sem reservas que ele se agrada de você, da mesma forma que disse que se agradava de mim. Isso eu posso e vou fazer. Mas não irei nada menos do que isso".
O outro lado igualmente importante disso é que, esse ajudador que, ao longo do processo, não fica satisfeito com nada menos do que a perfeição absoluta, também terá prazer nos primeiros esforços débeis e trôpegos que você fará amanhã para realizar o seu dever mais simples. Como um grande escritor cristão [George MacDonald) já dizia, todo pai se agrada com as primeiras tentativas do seu bebê para andar; nenhum pai ficaria satisfeito com algo menos do que um andar firme, desimpedido e masculino no seu filho adulto. Da mesma forma, diz ele, "Deus é fácil de agradar, mas muito difícil de satisfazer".

[C. S. Lewis]
- de Mere Christianity [Cristianismo Puro e Simples]

9 de julho de 2013

GABRIEL DUARTE

Arena MULTIPLICAÇÃO - FREE!

MÚSICA DO DIA [09.07.2013]


Salzband - Tudo É Novo

O TRATAMENTO COMPLETO

|9 DE JULHO|

ACHO que muitas pessoas já se aborreceram com [...] as palavras divinas: "Sejam perfeitos". Alguns parecem achar que isso significa: "enquanto vocês não forem perfeitos, eu não os ajudarei"; e como não conseguimos ser perfeitos, se Cristo quisesse dizer isso mesmo, nossa situação seria desesperadora. Porém, não acredito que ele quis dizer isso mesmo. Desconfio que ele quis dizer: "A única ajuda que eu lhe darei será para você se tornar perfeito. Você pode até querer algo menos, mas eu não lhe darei nada menos do que isso". 
Deixe-me explicar. Quando criança, muitas vezes eu tinha dor de dente, e sabia que, se eu falasse com a minha mãe, ela me daria algo que pararia com a dor durante aquela noite e me deixaria dormir. Mas eu não procurava a minha mãe - pelo menos não até a dor ficar realmente intensa. E eu tinha boas razões para tanto. Eu não duvidava que ela me daria a aspirina; mas eu sabia que ela faria algo mais. Eu sabia que ela me levaria ao dentista na manhã seguinte. Eu não podia obter dela o que eu estava querendo a não ser recebendo algo mais, que eu não queria. Eu desejava alívio imediato da dor; mas eu não o podia obter sem ter os meus dentes tratado permanentemente. E eu conhecia bem os dentistas; sabia que eles começariam a tratar outros dentes que ainda não tinham começado a doer. O lema dele é que é melhor prevenir do que remediar e, se você lhes dá um dedo, eles querem a mão toda.
Agora, se eu puder colocar dessa maneira, o Nosso Senhor é como um dentista. Se você lhe estende um dedo, ele pegará toda a sua mão. Muitas pessoas o procuram para serem curadas de algum pecado particular do qual tem vergonha (como masturbação ou covardia física) ou que obviamente está assolando sua vida diária (como mau humor ou bebedeira). Bem, ele o curará, sim; mas ele não irá parar por aí. Pode até ser que isso seja tudo o que você tenha pedido a ele; mas, uma vez que você o chame para entrar, ele lhe oferecerá tratamento completo.

[C. S. Lewis]
- de Mere Christianity [Cristianismo Puro e Simples]

8 de julho de 2013

PROTEGENDO-SE DO VENTO

|8 DE JULHO|

O VERDADEIRO problema da vida cristã aparece onde as pessoas normalmente não o procuram. Ele aparece no instante em que você acorda a cada manhã. Todos os seus desejos e esperança para o dia invadem você como animais selvagens. E a primeira tarefa de cada manhã consiste simplesmente em empurrá-los para trás; em dar ouvidos àquela outra voz, tomar aquele outro ponto de vista, deixar aquela outra vida mais ampla, mais forte e mais calma entrar como um brisa. E assim por diante, todos os dias. Manter distância de todas as inquietações e de todos os aborrecimentos naturais, proteger-se do vento.
No começo, somos capazes de fazê-lo somente por alguns momentos. No entanto, esse novo tipo de vida estará se propagando por todo o nosso ser, porque agora estamos deixando Cristo trabalhar em nós no lugar certo. Trata-se da diferença entre a tinta, que está simplesmente deitada na superfície, e um mofo ou mancha que penetra mais fundo. Jesus nunca disse baboseiras vagas e idealistas. Quando ele disse "sede perfeitos", quis dizer isso mesmo. Ele quis dizer que precisamos passar pelo tratamento completo. É muito duro; mas o tipo de compromisso que todos nós desejamos ardentemente é mais difícil - na verdade, é impossível. Pode ser duro para um ovo transformar-se em um pássaro; seria uma visão deveras divertida, e algo muito mais difícil, tentar voar enquanto ainda se é um ovo. Hoje nós somos como ovos. Porém, você não pode se contentar em ser um ovo comum, ainda que decente. Ou a sua casca se rompe ou você apodrecerá.

[C. S. Lewis]
- de Mere Christianity [Cristianismo Puro e Simples]

7 de julho de 2013

NOVA PERSPECTIVA

|7 DE JULHO|

O CRISTIANISMO afirma que cada ser humano viverá para sempre, e isso pode ser verdadeiro ou falso. Agora, tenho uma grande quantidade de coisas com as quais não vale a pena me preocupar se eu for viver só setenta anos, mas com as quais eu devo me preocupar se penso em viver para sempre. Talvez o meu mau humor ou a minha inveja estejam ficando gradativamente piores - de forma tão gradativa que o aumento durante esses setenta anos não será muito perceptível. Entretanto, isso pode vir a se tornar um inferno absoluto em um milhão de anos; de fato, se o cristianismo é verdade, inferno é o termo técnico mais correto para o que viria a ser. E a imortalidade gera essa outra diferença que tem algo a ver com a diferença entre o totalitarismo e a democracia. Se os indivíduos vivessem somente setenta anos, então um estado, ou nação, ou civilização que talvez dure mil anos seria mais importante que o indivíduo. Porém, se o cristianismo estiver correto, então o indivíduo não é apenas mais importante, mas incomparavelmente mais importante, pois ele é eterno, e a vida de um estado ou civilização, comparada com a sua, não passa de um momento.

[C. S. Lewis]
- de Mere Christianity [Cristianismo Puro e Simples]

6 de julho de 2013

REMÉDIO, NÃO ALIMENTO

|6 DE JULHO|

A IGUALDADE é para mim o mesmo que as roupas. Resulta da queda e é o remédio para ela. Qualquer tentativa de retroceder nos passos que demos até chegar ao igualitarismo e de reintroduzir as velhas autoridades no âmbito político é para mim tão tola quanto seria o ato de tirarmos toda a roupa. Tanto os nazistas quanto os nudistas cometem o mesmo erro. Porém, é o nosso corpo nu que continua existindo debaixo das roupas. É o mundo hierárquico, ainda vivo e (muito apropriadamente) escondido por trás da fachada de uma cidadania igualitária, que é a nossa preocupação real.
Por favor, não me entenda mal. Não estou reduzindo o valor dessa ficção igualitária, que é a nossa única defesa contra a crueldade mútua. Devo reprovar qualquer proposta de abolir o voto universal, ou o Married Women's Property Act*. Porém, a função da igualdade é puramente preventiva. Trata-se de medicina, não de alimento. Ao tratarmos os seres humanos (numa oposição prudente dos fatos observados) como se fossem todos do mesmo tipo, evitamos inúmeros males. No entanto, não fomos criados para viver com base nisso.

*Lei de propriedade das mulheres casadas, que lhes garantia alguns direitos de posse.

[C. S. Lewis]
- de The Weight of Glory [Peso de Glória]

5 de julho de 2013

O IMPERATIVO DEMOCRÁTICO

|5 DE JULHO|

EU ACREDITO na igualdade política. Porém, há duas razões opostas para alguém ser um democrata. Por um lado, você pode pensar que todos os homens são tão bons que merecem um lugar no governo da comunidade, e tão sábios que a comunidade necessita do seu conselho. Essa é, na minha opinião, a doutrina falsa e romântica do governo democrático. Por outro lado, você pode achar que o homem decaído é tão mau que nenhum homem merece confiança suficiente para exercer qualquer poder sobre os seus companheiros.
Acredito que essa seja a base verdadeira da democracia. Não acredito que Deus tenha criado um mundo igualitário. Acredito que a autoridade do pai sobre o filho, do marido sobre a esposa, do mais culto sobre o menos instruído é tão parte do plano original quanto a autoridade do homem sobre os animais. Creio que, se não tivéssemos caído, [...] a monarquia patriarcal seria a única forma de governo justa. Mas, como aprendemos a pecar, descobrimos, como o Lorde Acton diz, que "todo poder corrompe e o poder absoluto corrompe de forma absoluta". O único remédio tem sido abolir os poderes e substituí-los por uma ficção legal de igualdade. A autoridade do pai e do marido foi corretamente abolida no plano legal, não porque ela é má em si mesma (pelo contrário, trata-se, creio, de algo divino na origem), mas por causa da maldade dos pais e dos maridos. A teocracia foi corretamente abolida, não porque a autoridade dos padres sobre os leigos é ruim, mas porque os padres são pessoas tão más quanto todos nós. Até mesmo a autoridade do homem sobre os animais teve de ser restringida, porque ela é constantemente abusiva.

[C. S. Lewis]
- de The Weight of Glory [Peso de Glória]

4 de julho de 2013

A TIRANIA DA DEMOCRACIA

|4 DE JULHO|

Screwtape revela o seu objetivo definido

EU GOSTARIA que você focasse a sua atenção no vasto e poderoso momento em direção ao descrédito e, finalmente, à erradicação de todo o tipo de excelência humana - moral, cultural, social e intelectual. E não é bonito notar como agora a democracia (no sentido ilusório) está fazendo por nós o serviço que outrora era realizado pelas mais antigas ditaduras e com os mesmos métodos? Você lembra que um dos ditadores gregos (na época eles o chamavam de "tiranos") enviou um mensageiro a outro ditador para solicitar seu conselho sobre os princípios de governo. O segundo ditador levou o mensageiro a um campo de cereais e ali cortou com uma vara a ponta de toda haste que fosse uma ou duas polegadas mais alta que o nível geral. A lição era clara: não permita que ninguém entre os seus súditos se destaque. Não deixe sobreviver ninguém que seja mai sábio, ou mais bondoso, ou mais famoso, ou até mesmo mais belo que a maioria. Corte-os até ficarem no mesmo nível; todos escravos, todos insignificantes, todos "ninguéns". Todos iguais. Era assim que os tiranos praticavam, em certo sentido, a "democracia". Acontece que hoje a "democracia" é capaz de fazer o mesmo trabalho, sem nenhum outro tipo de tirania, a não ser ela mesma. Ninguém mais precisa ir ao campo com uma vara. Hoje as pequenas hastes arrancam a ponta dos grandes com os dentes. E as grandes estão começando a arrancar as suas próprias pontas, na esperança de se tornarem iguais às outras.

[C. S. Lewis]
- de The Screwtape Letters [Cartas do Diabo a seu Aprendiz]

3 de julho de 2013

O ENCANTAMENTO ANTIDEMONÍACO

|3 DE JULHO|

Screwtape apresenta evidências da corrupção do pensamento

AGORA, essa evidência tão útil de corrupção [o pensamento: "Sou tão bom quanto você"]  não é nada nova em si mesma. Ela já é conhecida pelos seres humanos há milhares de anos pelo nome de inveja. Porém, até hoje, eles sempre se referem a isso como o mais odioso e, ao mesmo tempo, o mais cômico de todos os vícios. Quem se dava conta desse sentimento sentia vergonha; quem não o percebia também não o percebia nos outros. A novidade mais prazerosa da presente situação é que você pode sancionar esse vício - torná-lo respeitável e até louvável - pelo uso mágico da palavra democrático.
Sob a influência desse encantamento, todos aqueles que estão, ou são, de alguma forma inferiores, podem trabalhar com mais afinco e suceder em rebaixar todas as pessoas ao seu próprio nível. Mas isso não é tudo. Sob a mesma influência, aqueles que chegam ou poderiam chegar mais perto de uma humanidade completa, na verdade se afastam dela com medo de serem antidemocráticos. Fui informado por fontes bastante seguras de que os jovens de hoje tentem a reprimir seu gosto secreto pela música clássica ou a boa literatura com medo de que isso os impeça de ser pessoas comuns; e que pessoas que realmente desejavam ser honestas, castas ou moderadas, e que tem ao seu dispor a graça que as capacitaria a ser, se recusam a ser. A aceitação poderia torná-las diferentes, representaria outra ofensa ao seu estilo de vida, tirá-las-ia do todo, prejudicaria a sua integração com o grupo. Elas talvez (que horror!) se tornariam indivíduos.
Tudo se resume a uma oração proferida recentemente por uma jovem: "Ó Deus, permita que eu seja uma menina normal do século vinte". Graças aos nosso esforços, isso pode ser cada vez mais entendido como: "Faça de mim uma uma pessoa vulgar, um idiota e um vagabundo".

[C. S. Lewis]
- de The Screwtape Letters [Cartas do Diabo a seu Aprendiz]

2 de julho de 2013

"SOU TÃO BOM QUANTO VOCÊ"

|2 DE JULHO|

Screwtape revela o gênio diabólico que faz os seres humanos afirmarem: "Sou tão bom quanto você"

A PRIMEIRA e mais óbvia vantagem disso é que, dessa forma, você induz o indivíduo a entronizar no centro de sua vida uma bela, sólida e retumbante mentira. Não estou me referindo simplesmente ao fato de que esta afirmação seja falsa, pois um ser humano é tão igual aos outros na honestidade, bondade e bom-senso quanto o é com relação à altura e às medidas físicas. O que quero dizer é que, na verdade, ele não acredita nessa afirmação. Nenhum homem que diga "sou tão bom quanto você" acredita nisso. Ele não diria isso se acreditasse. O cão São Bernardo não diz isso a um cachorro de brinquedo, nem o catedrático ao ignorante, nem o contratado ao desempregado, nem a mulher bonita à feia. A reivindicação de igualdade, fora do campo estritamente político, só é feita por aqueles que se sentem, de uma forma ou de outra, inferiorizados. O que isso revela é a consciência perturbada, doída, retorcida de uma inferioridade que o paciente se recusa a aceitar.
E por isso ele se magoa. Sim, fica ressentido com todo tipo de superioridade da parte dos outros; ele a denigre, desejando o seu aniquilamento. Chega ao ponto em que qualquer pequena diferença é interpretada por ele como uma tentativa do outro de se impor como superior. Ninguém pode ser diferente de na voz, na maneira de se vestir, no comportamento, na recreação, na escolha da comida. "Esse camarada fala inglês de forma mais clara e melodiosa do que eu - ele deve ser um metido, um arrogante, um pretensioso. Aquele camarada que diz que não gosta de cachorro-quente - sem dúvida, pensa que é bom demais para esse tipo de comida. Temos aqui um homem que não abriu a boca. Deve-se tratar de um daqueles sabichões intelectuais e está fazendo isso só para se mostrar. Se ele fossem o tipo certo de gente, eles seriam como eu. Não cabe a eles serem diferentes. Isso não é nada democrático".

[C. S. Lewis]
- de The Screwtape Letter [Cartas do Diabo a seu Aprendiz]