6 de março de 2013

A VERDADE SOBRE NÓS

|6 DE MARÇO|

QUALQUER pessoa, que não seja santa ou arrogante demais, tem de saber "viver mantendo as aparências em relação aos outros": ela sabe que há coisas dentro de si que estão bem aquém do seu comportamento público mais descuidado, até mesmo da sua conversa mais vaga. Quando o seu amigo hesita em pronunciar uma palavra, o que você pensa? Nunca dizemos a verdade toda. Podemos até confessar fatos lamentáveis - uma covardia mesquinha ou a mais injusta e prosaica impureza - mas em tom de falsidade. O próprio ato de confessar - em uma visão infinitesimamente hipócrita, com um toque de humor - contribui para você dissociar os fatos do seu próprio "eu". 
Ninguém suspeitaria quão familiares e, em certo sentido, apropriadas, essas coisas foram a nossa alma, e como completam o resto: bem no fundo, no calor do seu íntimo sonhador, não seria tão destoante, não soaria tão estranho e distante do resto, quanto parecem quando são traduzidas em palavras. Costumamos interferir, e muitas vezes acreditar, que os vícios habituais sejam atos individuais e excepcionais, e cometemos o erro oposto em relação às nossas virtudes - da mesma forma que o mau jogador de tênis que se refere à sua forma  normal como "dias ruins" e erroneamente chama seus sucessos raros de normais. Não acho que seja um erro nosso não conseguir dizer a verdade sobre nós mesmos; o murmúrio interior persistente e duradouro do rancor, da inveja, da lascívia, da cobiça e da autocomplacência, simplesmente não é traduzido em palavras. Porém, o que importa é que não devemos considerar nossos discursos inevitavelmente limitados como um relato total do pior que há dentro de nós.

[C. S. Lewis]
- de The Problem of Pain [O Problema do Sofrimento]

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