29 de dezembro de 2013

UM HINO À CRIAÇÃO DE DEUS

|29 DE DEZEMBRO|

FALAVA há pouco da latinidade do latim. Ela é mais evidente para nós do que seria para os romanos. Só percebemos a anglicidade do inglês quando conhecemos outra língua. Da mesma maneira, e pela mesma razão, só os sobrenaturalistas podem ver a natureza como ela é. É preciso afastar-se um pouco dela para depois virar-se e olhar para trás. Só então é que poderemos vislumbrar o verdadeiro cenário. Você precisará ter experimentado, ainda que brevemente, a água pura que está além do mundo para estar distintamente consciente do morno e salino sabor da corrente da natureza. Tratá-la como Deus, ou como tudo, é perder toda a sua essência e o seu prazer. Afaste-se, olhe para trás, e então verá... essa surpreendente catarata de ursos, bebês e bananas; esse dilúvio incessante de átomos, orquídeas, laranjas, caranguejos, canários, pulgas, gases, tornados e sapos. Como você pode pensar que essa era a realidade final? Como nunca pensou que se tratava simplesmente de um cenário para o drama moral da humanidade? Ela é ela mesma. Não lhe ofereça nem adoração, nem desprezo. Vá ao seu encontro e a conheça. Se somos imortais e se ela está condenada (como dizem os cientistas) a se deteriorar e morrer, vamos sentir falta dessa criatura meio tímida e meio ousada; esse ogro, essa fada travessa e incorrigível, essa feiticeira muda. Porém, os teólogos dizem que ela será remida da mesma forma que nós. A "vaidade" a que estava submetida era a sua doença e não a sua essência. Ela será curada no caráter; não domesticada (que os céus impeçam) nem esterilizada. Ainda estaremos em condições de reconhecer nossa velha inimiga, amiga, companheira e mãe adotiva, tão perfeita e mais ela mesma do que nunca. E esse será um encontro feliz.

[C. S. Lewis]
- de Miracles [Milagres]

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