4 de outubro de 2013

RISADINHAS NO ESCURO

|4 DE OUTUBRO|

Lewis lamenta a morte de sua esposa, Joy

SERÁ que um mortal poderia fazer perguntas que Deus considera irrespondíveis? Penso que isso seja muito fácil. Todas as questões absurdas são irrespondíveis. Quantas horas têm um quilômetro? Será que o amarelo é quadrado ou redondo? Provavelmente metade das questões que nós fazemos - metade dos nossos grandes problemas teológicos e metafísicos - são desse tipo.
E agora que eu estou pensando sobre o assunto, não há nenhum problema de ordem prática. Eu conheço os dois Grandes Mandamentos e seria melhor que eu os respeitasse. Na verdade, a morte de H. acabou com o problema prático. Quando ela estava viva, eu poderia, na prática, colocá-la acima de Deus; isto é, de fazer a vontade dela, em vez da vontade dele; se tivesse havido um conflito. O que resta não é nenhuma questão sobre o que eu seja capaz de fazer. Tudo gira em torno do peso dos sentimentos e motivações, e coisas desse tipo. Trata-se de um problema que eu coloco a mim mesmo. Não acredito que tenha sido Deus que o tenha posto em minha vida. [...]
De um lado, a união mística. Do outro, a ressurreição de um corpo. E não consigo imaginar um esboço de uma imagem, de uma fórmula ou sequer de um sentimento que os concilie. Contudo, a realidade que podemos compreender, consegue. E mais uma vez a realidade se revela iconoclasta. O reino dos céus resolverá nossos problemas, mas não mostrando-nos formas repentinas de reconciliação entre todas os nossos conceitos aparentemente contraditórios. Todos esses conceitos serão puxados de debaixo dos nossos pés como se puxa um tapete. E então veremos que, na verdade, não havia problema algum.
E volto, mais uma vez, a ter aquela sensação tão difícil de descrever, que só posso comparar ao som de risadinhas no escuro. A sensação de que, na realidade, a resposta está na chocante e desarmada simplicidade.

[C. S. Lewis]
- de A Grief Observed [A Anatomia de Uma Dor]

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